terça-feira, 28 de fevereiro de 2012

Homens do diálogo


A Agência Ecclesia nasce do trabalho que D. Manuel Falcão inaugurou no início da década de sessenta

“O trabalho começa hoje e não acaba nunca”. A afirmação é do Papa Paulo VI e compõe o penúltimo parágrafo da primeira encíclica do seu pontificado. Paulo VI falava do diálogo – teria de ser – e da prática que encontra tanto no “interior da Igreja” como com os de fora. Isso é sinal de que “a Igreja está hoje mais do que nunca viva”. “Mas – continua de imediato -, reparando bem, parece que tudo está ainda por fazer”.

Na Ecclesiam Suam, Paulo VI escreve 65 vezes a palavra diálogo. O documento é programático e de um pontificado que dava continuidade aos trabalhos do Concílio Vaticano II e teria de os fazer chegar à universalidade da Igreja. O Papa Montini reserva metade do texto, a segunda, para falar de diálogo. Antes, de outras duas atitudes que propõe para a Igreja Católica: consciência, renovação.

Na década de sessenta, e nos dias de hoje, o diálogo “com tudo o que é humano” é o horizonte. Paulo VI assume “de bom grado” essa “primeira universalidade”: “a vida, com todos os seus dons e problemas”. Depois, na definição de “círculos concêntricos” onde a Igreja Católica é chamada a estar em diálogo, refere os “crentes em Deus”; num terceiro círculo, o “mundo que se intitula cristão”. O Papa fala depois no diálogo dentro da Igreja, um “diálogo doméstico”, que deseja “familiar e intenso”.

O programa não é de há 50 anos. É dos dias de hoje. A comprová-lo, acontecimentos e sobretudo histórias de vida. Entre os acontecimentos, dois exemplos: a participação ativa e criativa de pessoas e instituições da Igreja Católica em iniciativas como Braga Capital Europeia da Juventude ou Guimarães Capital Europeia da Cultura.

Entre as vidas, sobressai a notoriedade de algumas. Sobretudo quando correspondem não a comportamentos ocasionais, antes a uma atitude permanente. É o caso de D. Manuel Franco Falcão.

Despedirmo-nos deste homem exige sobretudo dizer-lhe obrigado! Ao longo dos seus 89 anos, na universidade, no sacerdócio, no ministério episcopal viveu a urgência do diálogo. E dialogou; lançou-se ao encontro do outro, nos mesmos círculos concêntricos propostos pelo Papa Paulo VI.
Na História da Igreja em Portugal, D. Manuel Franco Falcão deixa capítulos inovadores sobre sociologia da religião, sobre diálogo da e na Igreja, sobre preservação e fruição do património. Deixa também largos passos dados na valorização dos meios de comunicação social. Concretamente, a Agência Ecclesia nasce do trabalho que D. Manuel Falcão inaugurou no início da década de sessenta. Por isso e por tudo, obrigado! Sobretudo por sempre ter valorizado essa fronteira do diálogo, onde a Igreja é chamada a estar cada vez com mais intensidade, o mundo dos media.

Paulo Rocha

sexta-feira, 24 de fevereiro de 2012

Proposta de percurso para a Quaresma 2012



Páscoa. Passagem. Desenvolvimento. Três palavras que indicam mudança. Três conceitos, expressões ou sentimentos que impelem a avançar na procura de um mundo novo com condições de vida humana e dignas de qualquer ser humano, esteja ele onde estiver. A FEC - Fundação Fé e Cooperação apresenta para este período da Quaresma um itinerário para a sua vivência como tempo de reflexão forte, não apenas no domínio pessoal mas em sociedade. Trata-se de uma proposta de ousadia, como não podia deixar de ser, não fora este o tempo da confiança.


Quaresma significa caminho de transformação, preparando a Páscoa, que significa passagem da morte à vida, da escravidão à liberdade. Viver a Quaresma e celebrar a Páscoa pretende ser e deve ser uma experiência de transformação que implica os cristãos na construção do Reino. Nesta Quaresma, a FEC volta a propor que este percurso de fé, seja transposto para o Desenvolvimento. Porque na realidade, os dois percursos não devem ser distintos, devem estar entrelaçados e alimentarem-se mutuamente. O desenvolvimento é a passagem de condições menos humanas a condições mais humanas (Encíclica Populorum Progressio).

Para além da sua acção na área da Cooperação para o Desenvolvimento, a FEC deseja promover espaços de reflexão sobre o desenvolvimento humano e sustentável e promoção da justiça global. Através da Rede Fé e Desenvolvimento, pretende promover este processo no seio da própria Igreja, repensando-se a si própria em diálogo com a sociedade.

Mais do que sugerir propostas de acção para esta Quaresma, quisemos catalisar um tempo de reflexão forte na vida de cada um e na vida em sociedade, neste momento difícil que atravessamos. As bases de partida para esta reflexão são as leituras próprias da liturgia de Quaresma e Pascoa, sobre as quais apresentamos duas propostas: 1/ Reflexões “Eis o Tempo Favorável” e 2/ Via-sacra. Com base na liturgia proposta para a Quaresma e Páscoa este itinerário é uma meditação a partir de diferentes perspectivas – Olhares cruzados diante da cruz e da ressurreição.

1/ A proposta “Eis o Tempo Favorável” é um percurso em oito etapas - 4ª feira de cinzas, seis domingos da Quaresma e domingo de Páscoa. Para cada etapa sugere-se uma dimensão do Desenvolvimento e um olhar a partir de um sector concreto da sociedade, fazendo reflexo da própria Encíclica Caridade na Verdade, em que o Papa Bento XVI aborda a Crise actual e o Desenvolvimento Humano Integral complementando estas diferentes perspectivas. Tivemos o privilégio e a oportunidade de cruzar a riqueza de diversos olhares e experiências de diferentes personalidades da sociedade portuguesa e também desde a Guiné Bissau e Angola, países em que a FEC trabalha.

Oito etapas percorridas com a ajuda de pessoas tão diferentes e que aceitaram responder ao desafio da FEC. Depois de D. José Policarpo, que em Quarta-feira de Cinzas, apresentou o olhar da Igreja Católica sobre o tempo Quaresmal, seguem-se nomes como: Pedro Rocha e Melo, vice-presidente da Brisa e membro da Associação Cristã de Empresários e Gestores; Maria Raquel Freire, professora de Política Internacional da Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra; Assunção Cristas, Ministra da Agricultura, Mar, Ambiente e Ordenação do Território, Pe. José Tolentino Mendonça, o jornalista do Público António Marujo, Guilherme d’Oliveira Martins, Presidente do Tribunal de Contas, Pe. Manuel Augusto Ferreira mccj, Ir. Marlene Wildner, Ir. Esperanza Ospina, Nuno Macedo, Américo Mendes, Maria Raquel Freire, Rita Cortez aci, José Frazão sj.

2/ A Via Sacra do Desenvolvimento foi construída com a colaboração de várias organizações e Movimentos: Fundação Gonçalo da Silveira, Leigos para o Desenvolvimento, Procuradoria das Missões Claretianas, Escravas do Sagrado Coração de Jesus, Rosto Solidário, Equipa d’África, FEC Angola e FEC Guiné Bissau.

Contextualizar o momento que o país e mundo atravessam à luz da História da Salvação, integrando Cristianismo e Cidadania e dar, ao mesmo tempo, instrumentos para uma acção cristã mais reflectida são as razões que levam a FEC a apresentar este caderno de esperança. Diferentes olhares pascais que dão origem a uma “Parábola do Desenvolvimento” que se espera ser capaz de iluminar corações.

O desafio que se deixa é que cada um continue este exercício: de aproveitar este tempo forte de Quaresma para parar e avaliar de que forma a sua vida e a sua realidade estão a ser/ devem ser lugares de Páscoa e Desenvolvimento.
Boa Quaresma!
Clique aqui  para consultar a proposta.

terça-feira, 21 de fevereiro de 2012

Faleceu D. Manuel Falcão, Bispo emérito de Beja


Com sentimentos de amizade e solidariedade cristã comunico que na noite de 20 para 21 de Fevereiro adormeceu no Senhor, na casa episcopal de Beja, na sua cama, o nosso querido D. Manuel Franco de Oliveira Falcão. O seu corpo será velado na sé de Beja, a partir do fim da manhã deste dia 21, às 18,30 horas haverá celebração da Eucaristia, às 21,00 horas Eucaristia com o Ofício de Leituras e amanhã, dia 22, pelas 10,30 horas, solenes exéquias na Sé Catedral, seguindo-se o cortejo para o cemitério de Beja, onde será depositada a urna no jazigo dos bispos de Beja.
Confiando-o à sua oração e, caso lhe seja possível, a participação em algum dos momentos de oração comunitária junto à urna,
Subscrevo-me com amizade
† António Vitalino, bispo de Beja



D. Manuel Franco da Costa de Oliveira Falcão
Biografia

Nasceu na Freguesia de S. Mamede, Lisboa, em 10 de Novembro de 1922, filho de Manuel da Costa Falcão e de Maria Firmina Falcão. Após ter completado os estudos primários e secundários, tirou o Curso de Engenharia Mecânica do I.S.T. e entrou no Seminário dos Olivais em 1945.
Foi ordenado sacerdote a 29 de Junho de 1951 pelo Cardeal Patriarca de Lisboa, D. Manuel Gonçalves Cerejeira. Devido á sua grande cultura e poder de organização, tornou-se perito no âmbito da sociologia religiosa, e estudou a remodelação paroquial da cidade de Lisboa, organizou o Secretariado das novas Igrejas e presidiu à Comissão preparatória da reestruturação pastoral do Patriarcado de Lisboa.

Bispo Auxiliar do Patriarcado de Lisboa
A 16 de Dezembro de 1966 é nomeado Bispo auxiliar do Patriarcado de Lisboa, sendo ordenado Bispo em 22 de Janeiro de 1967, por D. Manuel Gonçalves Cerejeira. e tendo como co-sagrantes o Arcebispo D. António de Castro Xavier Monteiro, (Bispo de Lamego) e D. António de Campos, (Bispo Auxiliar de Lisboa).

Bispo de Beja
Por nomeação Pontifícia de Paulo VI, a 27 de Novembro de 1974 é nomeado Bispo Coadjutor com direito de sucessão de D. Manuel dos Santos Rocha, tomando posse a 22 de Janeiro de 1975. À resignação do Arcebispo-Bispo D. Manuel dos Santos Rocha, por limite de idade, a 8 de Setembro de 1980, D. Manuel Falcão passou a Bispo Residencial.

A entrada solene na Sé de Beja fez-se no dia 1 de Outubro, escolhido por ser início do ano pastoral e memória litúrgica da padroeira das Missões, Santa Teresa do Menino Jesus.
Na continuidade da acção anterior, impulsionou a evangelização da Diocese, especialmente por meio de missões populares de 15 dias, seguidas de visita pastoral às paróquias quanto possível de cinco em cinco anos. Um dos frutos destas missões foi a constituição de numerosas pequenas comunidades eclesiais de oração e catequese.
A sua acção foi caracterizada pela aplicação dos princípios científicos da Sociologia religiosa aos Planos e Programas de acção pastoral, ao mesmo tempo que prestou grandes serviços á Conferência Episcopal Portuguesa. Estabeleceu um diálogo crítico e objectivo com a sociedade, o que provocou respeito e admiração pela sua pessoa.
Em 1984 criou o Departamento do Património Histórico e Artístico da Diocese de Beja (DPHA) com a finalidade de dar a conhecer e proteger o património artístico e religioso da Diocese.

O Papa João Paulo II aceitou a sua resignação a 25 de Janeiro de 1999, ficando como Administrador Apostólico da Diocese até à tomada de posse de seu sucessor D. António Vitalino Fernandes Dantas, no dia 11 de Abril do mesmo ano.
Continuou a residir no Paço Episcopal de Beja, onde faleceu a 21 de Fevereiro de 2012.

Recolha SDMBeja

À laia de testamento espiritual


O senhor D. Manuel Falcão, que desde os quinze anos escreve nos jornais, soube utilizar, desde a primeira hora, o seu e nosso “Notícias de Beja” como tribuna privilegiada para anunciar o Evangelho e fazer uma correcta leitura cristã dos acontecimentos. À última colaboração, começada a 26 de Janeiro último, deu o nome sugestivo de “À laia de testamento espiritual”. Será que estaria a adivinhar a sua passagem, a dádiva total da sua vida à sua querida Diocese de Beja? Apareceram 4 reflexões. Transcreve-se a primeira: “Uma existência envolta em mistérios”.
À laia de testamento espiritual (1)

“É bom reflectir nos mistérios que envolvem a nossa existência e para eles chamar a atenção dos outros. É esta a minha intenção ao passar a escrito as reflexões que aqui tenciono publicar à laia de testamento espiritual.

Sentido da palavra mistério
No Dicionário da Academia das Ciências, a palavra “mistério” aparece com onze significados: uns de sentido comum (p. ex., realidade que aparece como desconhecida ou enigmática); outros de sentido religioso pagão (p.ex., actos de culto para iniciados); e outros ainda de sentido cristão (p.ex., dogma de fé definido pela Igreja, ou os “mistérios” do Rosário).
Nesta série de reflexões, a palavra “mistério” é empregada no sentido teológico de verdade a que temos acesso por revelação divina, mas que, pela sua transcendência, ultrapassa a nossa compreensão, embora a devamos guardar no mais íntimo do nosso ser (no que se costuma chamar o coração). A tais verdades nós, cristãos, devemos aderir pela virtude da fé, acalentada pela caridade, na esperança de que, depois da morte, as entendamos à luz do próprio Deus contemplado face a face.
Assim, são mistérios que envolvem a nossa existência humana: o da própria origem e razão de ser do Homem e do Universo; o do sofrimento e da morte que afectam a nossa vida; o da revelação divina ao longo dos séculos até à sua plenitude em Jesus Cristo; o da vida íntima de Deus; e o da Igreja por Cristo instituída e animada pelo Espírito Santo, para guardar e anunciar a todos os homens a revelação e a todos conduzir até à felicidade eterna.

Mistérios e verdades naturais
Ao longo da nossa vida, desde criança até à idade madura, procurámos entender o mundo que nos rodeia e em que nos movimentamos.
Para isso contámos com a observação pessoal, com a observação alheia a que tivemos acesso, com a experimentação e, especialmente hoje, com as descobertas das Ciências.
E isto, na ânsia de dominar o que chamamos a Natureza, de modo a tirar dela o que contribui para a nossa sobrevivência, para a nossa auto-satisfação e para uma vida cada vez mais segura e confortável.
Que, ao longo dos séculos, os conhecimentos práticos e científicos têm crescido, basta pensar no contraste existente entre os povos ditos civilizados e outros, especialmente os que ainda vivem à maneira do homem primitivo.

O acolhimento dos mistérios pelo pensamento moderno
O pensamento moderno, que nos países do Primeiro Mundo surgiu nos finais da idade Média e se tem desenvolvido sobretudo desde a Revolução Francesa, tende a despertar no homem o sentimento de íntima satisfação (de orgulho) e lhe dão a secreta (e falaz) alegria de se sentir capaz de tudo saber e tudo resolver em ordem a uma existência feliz.
Basta ver o que se ensina nas escolas, nas conversas entre amigos e nas mensagens da comunicação social reflectidas nas telenovelas.
Já passou o tempo em que o homem da rua pensava com os respectivos governantes e, nomeadamente, tinha a mesma religião que eles.
Hoje, somos constantemente convidados a ter as nossas próprias ideias a respeito de tudo e a nos governarmos com elas, pensando que só desta maneira nos podemos considerar verdadeiramente livres.
Daqui, a dificuldade do homem da rua em aceitar como verdades os mistérios, cujo sentido não pode compreender, tanto mais que eles são revelados aos espíritos humilde e confiantes, abertos a acreditar em Deus e no que Ele nos revela para nosso bem.


As reflexões que se seguirão, muito marcadas pelas revelações dos mistérios da fé, são convite aos nossos leitores para reflectirem à luz divina nas mais profundas realidades da nossa existência, para melhor admirar e adorar o Deus que no-las revelou.
Assim fazendo, tornamos mais viva a nossa religião, tanto mais que muitas vezes ela quase se limita aos actos rituais da liturgia e a certas orações feitas mecanicamente em determinadas horas do dia.
Por isso a estas reflexões resolvi dar o nome de “testamento espiritual”.

+ Manuel Franco Falcão,
Bispo emérito de Beja”
(Notícias de Beja, ed.de 26de Janeiro de 2012)
Recolha SDMBeja

domingo, 19 de fevereiro de 2012

Ver e prestar atenção aos outros


Quaresma de 2012


Mais um tempo de Quaresma, o espaço de 40 dias que antecedem a Páscoa, desde Quarta-feira de Cinzas até à Semana Santa. Para os cristãos é tempo de conversão ao essencial, espelhado na pessoa de Cristo, dando maior atenção aos tempos de oração, à prática da esmola e do jejum ou penitência.

Nesta breve mensagem evitarei as palavras austeridade, moderação, sacrifícios, penitência, que descrevem atitudes muito próprias da Quaresma, mas podem provocar o efeito contrário ou a indiferença e até mesmo indignação, pois estão muito gastas de tão repetidas, para além de muitos estarem a sofrer tudo isso na própria pele.

Vou inspirar-me na mensagem do Papa Bento XVI para esta Quaresma, que, por sua vez, se inspira num trecho da Carta aos Hebreus, que diz: «Prestemos atenção uns aos outros, para nos estimularmos ao amor e às boas obras» (Heb 10, 24). Neste sentido peço apenas para vivermos este tempo com um olhar mais atento a quem nos rodeia, sobretudo aos que mais sofrem, corporal ou espiritualmente, estimulando-nos mutuamente no amor e na prática das boas obras.

Nestes dias muito se tem falado do triplo homicídio da família Esperança de Beja, mas pouco se ouviu dizer acerca das causas e da prevenção ou cura deste e outros males que afetam as nossas famílias e a sociedade.

1. A atenção ao Outro e aos outros
Desde o nascimento dependemos dos outros e são eles que nos ajudam a crescer, em todos os aspetos da vida humana. Manter-se fixado em si mesmo é um comportamento egoísta, um desvio e uma doença. Abrindo-nos a pouco e pouco a quem nos rodeia, vamo-nos inserindo na família e na sociedade, para aí assumirmos as nossas responsabilidades.
Assim como a família se responsabilizou por nós, também somos chamados a sermos responsáveis pelos outros. Esta atitude humana é também profundamente cristã. Somos responsáveis uns pelos outros e por isso temos de prestar atenção a quem nos rodeia e zelar pelo seu bem corporal e espiritual.

Hoje fala-se muito da cultura de proximidade, de boa vizinhança. No fundo trata-se de cumprir aquilo que se chama o amor ao próximo, que começa pela atenção aos outros, a começar pelos mais próximos, mas sempre com um olhar de amor, de quem quer e deseja o bem do outro, e não com olhos de inspetor, de polícia ou de fiscal, à espera de apanhar alguém em falta. Se pusessemos em prática esta atenção ao próximo, ao vizinho, não aconteceriam tantos casos de cadáveres esquecidos nos apartamentos durante semanas e muitas misérias seriam prevenidas. Cultivar a boa vizinhança será um bom exercício quaresmal, não apenas para os cristãos, mas para todos os cidadãos.

Mas os cristãos têm motivos ainda mais fortes para cultivar esta atitude. Em Cristo formamos um só corpo. Se um membro sofre, está doente e não cumpre a sua missão, todo o corpo sofre com isso. Nenhum membro pode viver para si mesmo, mas para o bem de todo o corpo. Esta imagem do corpo, aplicada à Igreja e às comunidades cristãs, sobretudo nas cartas de S. Paulo, ilustra muito bem o comportamento que devemos ter.

Ninguém pode dizer que os outros não lhe dizem respeito. Temos de contribuir para o seu bem material, mas também espiritual. Por isso as obras de misericórdia são corporais e espirituais. Partilhar o pão material não basta. Ensinar os ignorantes e corrigir fraternalmente quem erra faz parte da vida cristã. Mas ao fazer isto, não é com arrogância que o fazemos, mas com um olhar humilde e cheio de compaixão e de misericórdia, à semelhança de Cristo no seu encontro com os pecadores e os doentes. Se nem sempre somos correspondidos, temos a certeza que não ficaremos sem recompensa. Se outra não for, fica o bem que nos fazemos a nós mesmos, pois mais vale dar que receber.

2. Integrar e integrar-se na comunhão e na comunidade eclesial
Um outro elemento importante da recomendação da carta aos Hebreus é que nos devemos estimular uns aos outros na prática do amor e das boas obras. Temos necessidade de nos apoiar mutuamente no caminho da perfeição e da santidade. Um santo não se faz sozinho. Precisa da graça de Deus que nos é transmitida através da comunhão eclesial, na oração, na vivência sacramental e na prática da caridade. Isto significa que temos necessidade de nos reunir como comunidade de fé.

A reunião comunitária por excelência é a Eucaristia dominical, mas também quando celebramos os outros sacramentos, como o Batismo, o Crisma, o Matrimónio ou participamos em alguma ordenação para o serviço à comunidade. Um grande testemunho de comunhão acontece também quando nos reconciliamos com Deus e a Igreja pelo sacramento da confissão e quando levamos o viático a algum doente, que já não pode deslocar-se ao local de culto da comunidade. Fortalece os laços de comunhão do doente e sua família com a Igreja, mas também da Igreja com os irmãos que sofrem.

O mesmo se pode dizer da partilha fraterna com os mais pobres. Mas sobre este terceiro ponto escreverei na próxima semana, comunicando o resultado da renúncia quaresmal de 2011 e dando orientações sobre o destino da renúncia desta Quaresma que agora começa, depois de consultar o Conselho Presbiteral, que se reúne esta semana.

Desde já a minha gratidão em nome dos pobres que ajudarmos com a nossa partilha fraterna e votos de uma Santa Quaresma de 2012, no caminho do nosso seguimento de Jesus Cristo, que se entrega por nós e por nosso amor até ao dom da vida, para que nós tenhamos vida em abundância.


† António Vitalino, Bispo de Beja

sexta-feira, 10 de fevereiro de 2012

Mensagem do Papa Bento XVI para o XX Dia Mundial do Doente


«Levanta-te e vai, a tua fé te salvou!» (Lc 17, 19)





Amados irmãos e irmãs,

Por ocasião do Dia Mundial do Doente, que celebraremos no próximo dia 11 de Fevereiro de 2012, memória da Bem-Aventurada Virgem de Lourdes, desejo renovar a minha proximidade espiritual a todos os enfermos que se encontram nos lugares de cura ou recebem os cuidados das famílias, enquanto manifesto a cada um deles a solicitude e o afecto da parte de toda a Igreja. No acolhimento generoso e amoroso de cada vida humana, sobretudo da frágil e doente, o cristão expressa um aspecto importante do seu testemunho evangélico, segundo o exemplo de Cristo, que se debruçou sobre os sofrimentos materiais e espirituais do homem para os curar.

1. Neste ano, que constitui a preparação mais próxima para o solene Dia Mundial do Doente, que será celebrado na Alemanha no dia 11 de Fevereiro de 2013 e que meditará sobre a emblemática figura evangélica do bom samaritano (cf. Lc 10, 29-37), gostaria de chamar a atenção para os «Sacramentos de cura», ou seja, o Sacramento da Penitência e da Reconciliação, e o Sacramento da Unção dos Enfermos, que encontram o seu cumprimento natural na Comunhão Eucarística.



COM A TERNURA DO MEU OLHAR

Com a ternura do meu olhar
Irmão doente, que no rosto transpiras a ansiedade,
Estou perto de ti, para que nas dores da solidão
E do silêncio que escutas quando chamas ou dormes,
Sintas que não estás sozinho nas nuvens sem luz


Com a ternura do meu olhar
Não tenho pressa, nem desvio o meu andar,
Mas sorrio e contigo faço uma troca de afectos
Que irrompem do fundo da minha alma
Como a água cristalina do ventre da terra generosa.


Com a ternura do meu olhar
Contemplo em ti não um estranho, mas o meu irmão,
Que estás no lugar que, Deus o sabe, pode ser meu amanhã
E que tens o valor duma vida sem preço
Para quem contempla em ti as mil cores que há no céu


Com a ternura do meu olhar
As mãos de oiro que te curam as chagas do corpo
Fazem-me sentir as dores que choram nos teus olhos
E lembram que precisas de médicos para o corpo e para alma
Pois na vida breve, fugir da morte pode ser fugir da vida.


Com a ternura do meu olhar
Amar-te é o meu prazer, és a parte que a mim me falta,
Não és um sem nome nas estatísticas e nos custos,
Mas o próprio Cristo vivo e exposto à minha frente,
Que me lembra, sempre, que é a Ele que visito e amo


(Capelania do Hospital do Barreiro)

quinta-feira, 9 de fevereiro de 2012

Conhecer as experiências de outros, ajuda e desafia


Arciprestado de Aveiro organiza Semana Missionária 
no início na Quaresma

No arranque do tempo litúrgico da Quaresma, o Arciprestado de Aveiro organiza, entre os dias 25 de Fevereiro e 4 de Março, uma Semana Missionária. As paróquias do Arciprestado
aveirense contarão com a presença de oito "duplas" de missionários para a realização desta acção que tem como objectivo principal promover a consciência missionária das comunidades paroquiais no seu interior, abrindo-se também à missão "ad gentes". A iniciativa arranca no sábado, dia 25, no Seminário de Esgueira, com o acolhimento dos missionários e com um momento de oração e de envio.
Da parte da tarde as oito equipas missionárias estarão já nas respectivas paróquias para desenvolverem as actividades previstas.
A nossa paróquia desenvolve esta semana juntamente com a paróquia da Vera Cruz. Do que já está programado destaca-se visita às escolas e encontros com alunos, participação nos encontros de catequese, vigília de oração, e jogo pela cidade para crianças, adolescentes e jovens. A vigília de oração terá lugar na igreja do Carmo, na quarta-feira, dia 29, às 21h30. O jogo de cidade acontecerá no sábado dia 3, também em conjunto com a paróquia da Vera Cruz. Neste mesmo dia, às 21h30, na igreja de Santa Joana terá lugar o Festival Missionário, um momento festivo de todo o Arciprestado onde serão apresentados testemunhos das vivências que aconteceram durante toda a semana.
Trata-se de uma oportunidade de mergulharmos no cerne do nosso ser cristão. De facto, a
Igreja ou é toda missionária ou não é. Vamos acertando as nossas agendas para podermos
marcar presença nas diversas iniciativas.

Pe. José António Carneiro
(in Paróquia da Glória – Diocese de Aveiro)

terça-feira, 7 de fevereiro de 2012

Missões Populares e Ano da Fé


A Congregação para a Doutrina da Fé divulgou, no dia 6 de Janeiro, uma nota com as indicações pastorais para o Ano da Fé. A nota contempla todos os níveis da Igreja, desde o nível universal, das conferências episcopais, diocesano e a nível das paróquias, comunidades, associações e movimentos.

A nível paroquial, a referida nota, diz: “Será oportuno promover missões populares e outras iniciativas nas paróquias e nos lugares de trabalho para ajudar os fiéis a redescobrir o dom da fé abismal e a responsabilidade do seu testemunho, na consciência de que a vocação cristã é também, por sua própria natureza, vocação ao apostolado” (nº6) e ainda: “Deste modo se deseja que todo o povo cristão comece uma espécie de missão endereçada aqueles com os quais vive e trabalha, com consciência de ter recebido a mensagem da salvação para a comunicar a todos” (nº10).

Com a Carta Apostólica Porta Fidei, Bento XVI, convoca a Igreja para o Ano da Fé. “Este terá início a 11 de Outubro de 2012, no cinquentenário da abertura do Concílio Vaticano II, e terminará na Solenidade de Nosso Senhor Jesus Cristo Rei do Universo, a 24 de Novembro de 2013. Na referida data de 11 de Outubro de 2012, completar-se-ão também vinte anos da publicação do Catecismo da Igreja Católica” (nº4).
A diocese de Beja, desde há muitos anos, tem apostado forte nas Missões Populares. Embora não seja o único meio de evangelização, são um tempo forte de catequese e de encontro com a comunidade, capaz de criar grupos de reflexão bíblica e doutrinal, através das assembleias familiares. Nesse sentido, e continuando a valorizar este meio simples de dinamizar as comunidades, o nosso Bispo, decidiu dar maior visibilidade a esta forma de evangelizar, trazendo para a Diocese uma Comunidade Missionária (Irmãs Espiritanas), organizando o Secretariado das Missões e fomentando a realização de Missões Populares e a formação de Animadores de Comunidades.
Mesmo antes das propostas da Congregação para a Doutrina da Fé, em vários lugares se marcaram e se preparam para a Missão Popular. Para este ano pastoral, estão previstas várias: S. Teotónio (Abril), Cercal do Alentejo (Maio), Boavista dos Pinheiros (Junho). Para o próximo ano já se encontram calendarizadas duas: Santo André (Novembro) e Vale de Água (Março). Há arciprestados que estão a reflectir sobre este desafio. Além disso, e para além do Encontro de animadores, em Santiago do Cacém, tem havido encontros de animação missionária nas paróquias em que houve Missão Popular recentemente (S. Domingos, Abela, Ermidas, Alvalade, S. Francisco).
Em S. Teotónio, para preparar a Missão (Fataca, Malavado e Azenha do Mar) um grupo de leigos, as Irmãs e o P. Abílio Raposo, estão a fazer uma experiência muito interessante, a qual poderá servir de exemplo para outras paróquias. Todas as semanas, desde Novembro, se reúnem para uma preparação séria e competente para este serviço de animador e dinamizador de grupos. Os temas apresentados versam sobre a Palavra de Deus, a Igreja, os Sacramentos, as verdades da Fé - Credo, e ainda, métodos para animar e conduzir um grupo. Além disso, há momentos de oração e de celebração.
A Missão Popular, no passado e noutras circunstâncias, é agora uma das propostas da Congregação da Doutrina da Fé, para viver o Ano da Fé e para viver a fé todo o ano. Sem menosprezar os outros caminhos e meios, torna-se necessário acolher, aceitar e desenvolver este desafio. As razões são simples: ir ao encontro das pessoas, ajudá-las a descobrir a descobrir o amor de Deus, a criar relação de amizade e fazer comunidade, a ler e a aprofundar a palavra de Deus. Claro que dá trabalho, exige empenho e cria compromissos. O exemplo da comunidade de S. Teotónio pode ajudar. Outros poderão experimentar e todos ficaremos a ganhar!

P. Agostinho Sousa
Secretariado Diocesano das Missões

sexta-feira, 3 de fevereiro de 2012

As testemunhas da Fé


Quando falamos de testemunhas estamos a situar-nos perante as sentinelas que nos ajudam a ver durante a noite em que podemos situar-nos. Porém, são vigias nocturnas que não recorrem aos gritos ou alvoroços, mas antes cumprem a sua missão recorrendo a palavras fortes e convincentes ou sendo presenças silenciosas e anónimas, mas consistentes, quer dizer, firmes, sólidas, estáveis, constantes ou duradoiras.
Pela presença de numerosas testemunhas cristãs podemos ver, na Igreja, atitudes, comportamentos ou vivências nem sempre evangélicas, bem como a presença activa do Reino de Deus e da sua justiça.

A diversidade nas testemunhas

Há testemunhas de renome, veiculadas pela comunicação social, e testemunhas anónimas, porém com a força para, confundidas com o povo humilde, serem fermento no meio da massa. Quero acreditar que, também nos tempos actuais, apesar da fragilidade própria da condição humana, a Igreja continua a ter numerosas testemunhas do Evangelho.
Apesar da grande tentação da procura de nome e renome, não podemos esquecer-nos que a fé se transmite principalmente a partir de um certo anonimato, apesar de contar com uma “nuvem de testemunhas ao nosso redor” (He. 12, 1). Sem cometer injustiça, não é fácil chamar pelo nome ou hierarquizar com objectividade as testemunhas da fé.

A qualidade do testemunho

Também na Igreja existe o perigo de fazer comparações, falando de uns e esquecendo a outros. Quando cedemos à tentação de nos fixarmos cegamente nuns, tornamo-nos incapazes de neles vislumbrar a transcendência evangélica, apesar de famosos aos nossos olhos. Qual é a nossa ambição, enquanto servidores da Igreja? A fama ou a significação evangélica? O serviço humilde e generoso do evangelho ou a pertença a uma espécie de casta, a procura do poder efémero? Os chefes das nações exercem o seu poder e procuram sempre os primeiros lugares. Na sociedade há pretensos doutores e mestres a mais, verdadeira negação do Evangelho.
Por isso, não deve ser assim na comunidade cristã onde só há lugar para irmãos, sinal visível da sua condição de discípulos de Jesus Cristo.

O testemunho para a transmissão da fé

Desde os primórdios, cristianismo transmite-se principalmente “por contágio”, de “boca a boca”, por encontros ou catequeses simples e humildes, encontros pessoais onde as pessoas se encontram, às vezes confundidos com “o acaso”: Diácono Filipe e o Eunuco, funcionário da rainha da Etiópia (Act.8, 26ss), Filipe e a conversão do mago da Samaria (Act. 8,9-13), o paralítico Eneias (Act. 9,33-35), Paulo e os companheiros na Sinagoga de Antioquia da Pisídia (Act. 13,14ss), Lídia, a negociante de púrpura, e outras mulheres, junto às margens do rio em Filipos (Act16,11-15) A história de Filipe, Pedro, Paulo e Barnabé repete-se e continua viva e actuante ainda hoje.
Quando deflectimos hoje sobre o aparente fracasso na transmissão da fé, apesar das celebrações sacramentais relacionadas com a iniciação cristã, facilmente concluiremos que, mais do que pelos ouvidos, a fé necessita da visualização dos testemunhos
coerentes. Ora, faltando a evidência coerente das testemunhas, as melhores palavras perdem a sua força.

Testemunhar a verdade

No centro do testemunho cristão, o Espírito Santo, suprema interiorização do testemunho, porque “é a verdade” (1 Jo.5,6). No processo judicial entre Cristo e o mundo, o Espírito Santo é a testemunha que convencerá o mundo do pecado, da justiça e do juízo. (Jo.16, 8-11). Por isso, não basta que haja testemunhas.
É necessário que o se testemunho seja verdadeiro. Sem prejuízo da criatividade e iniciativa pessoais, as nossas opções pastorais têm que ser tomadas a partir da Palavra de Deus e da experiência da Igreja, visando a experiência pessoal, a intimidade, e
a celebração da comunhão com Deus.




P. António Novais Pereira,
Pároco de Santo André e Arcipreste de Santiago do Cacém
“In Notícias de Beja, 2 Fevereiro 2012)

quinta-feira, 2 de fevereiro de 2012

Consagrados da Diocese de Beja Festa da Apresentação do Senhor


Ó Maria, Mãe da Igreja, confio-te toda a vida consagrada, para que lhe obtenhas a plenitude da luz divina: viva na escuta da Palavra de Deus, na humildade da sequela de Jesus, teu Filho e nosso Senhor, no acolhimento da visita do Espírito Santo, na alegria diária do magnificat, a fim de que a Igreja seja edificada pela santidade de vida destes teus filhos e filhas, no mandamento do amor. Amém! (Oração do Papa Bento XVI a 2.2.2011 na oração de Vésperas com os Consagrados, em Roma).

Caríssimos irmãos e irmãs na vida consagrada,

Neste dia em que a Igreja celebra a festa da Apresentação do Senhor, desde há anos proclamado também dia da vida consagrada, faço minha esta linda oração do Santo Padre, proferida nas vésperas rezadas nesse mesmo dia, no ano passado, em Roma, com muitos consagrados reunidos na basílica de S. Pedro.

A vida consagrada é um dom precioso na vida da Igreja e nas igrejas particulares. Por isso agradeço a Deus a presença apostólica dos consagrados na nossa diocese de Beja. Têm carismas diferentes, que contribuem para o bem de todo o corpo eclesial.

Os dons agradecem-se, mas também se imploram de Deus e precisam de ser bem acolhidos e acompanhados na comunidade eclesial. Por isso peço a todos os meus diretos colaboradores para ter em grande apreço os consagrados, estar atentos às vocações que surjam, acompanhá-las no discernimento dos sinais de chamamento e orientá-las para os diferentes carismas.

Neste ano temos mais uma comunidade de vida consagrada, as missionárias do Espírito Santo, a residir em Zambujeira do Mar, composta pelas irmãs Maria Emília de Matos Vitorino (coordenadora da comunidade), Maria da ascensão Marques Lourenço e Maria Gorete Vaz Correia, cujo endereço e contato é o seguinte: Monte da Zambujeira, 7630-737 Zambujeira do Mar, tel. 283 959 221, email: espiritanasteotonio@sapo.pt.

Na diocese celebramos juntos este dia no domingo a seguir, este ano a 5.2.2012, no Seminário de Beja, começando o encontro às 15,00 horas com uma palestra do provincial dos Missionários do Verbo Divino, Pe. José Antunes. Segue-se a celebração da Eucaristia na capela do Seminário, com instituição de acólito do seminarista Luís Taborda Fernandes, de Grândola. O encontro termina com um lance partilhado.

Espero que todos possam participar e partilhar a alegria do testemunho da diversidade de dons.
† António Vitalino, Bispo de Beja
01 de Fevereiro de 2012

APRESENTAÇÃO DE JESUS, ENCONTRO E LUZ

1. A Igreja Una e Santa celebra em 2 de Fevereiro, quarenta dias depois do Natal, a Festa da APRESENTAÇÃO do Senhor, que as Igrejas do Oriente conhecem por Festa do ENCONTRO (Hypapantê) e dos Encontros: Encontro de DEUS com o seu POVO agradecido, mas também de MARIA, de JOSÉ e de JESUS com SIMEÃO e ANA. Também connosco.

2. Quarenta dias depois do seu nascimento, sujeito à Lei (Gálatas 4,4), JESUS, como filho varão primogénito, é APRESENTADO a Deus, a quem, sempre segundo a Lei de Deus, pertence. De facto, o Livro do Êxodo prescreve que todo o filho primogénito, macho, quer dos homens quer dos animais, é pertença de Deus (Êxodo 13,11-13), bem como os primeiros frutos dos campos (Deuteronómio 26,1-10).

3. É assim que, para cumprir a Lei de Deus, quarenta dias depois do seu nascimento, JESUS é levado pela primeira vez ao Templo, onde, também pela primeira vez, se deixa ver como a Luz do mundo e a nossa esperança.

4. Compõe a cena um velhinho chamado SIMEÃO, nome que significa «ESCUTADOR», que vive atentamente à escuta, e que o Evangelho apresenta como um homem justo e piedoso, que esperava a consolação de Israel (Lucas 2,25). Ora, esse velhinho que vivia à espera e à escuta, com solícita atenção, veio ao Templo, e, ao ver aquele MENINO, pegou nele nos braços (por isso, os Padres gregos dão a SIMEÃO o título belo de Theodóchos = recebedor de Deus), e entoou o canto feliz do entardecer da sua vida, um dos mais belos cantos que a Bíblia regista: «Agora, Senhor, podes deixar o teu servo partir em paz, porque os meus olhos viram a tua salvação, que preparaste diante de todos os povos, Luz que vem iluminar as nações e glória do teu povo, Israel!» (Lucas 2,29-32). Este cântico de tonalidade serena e de radiosa tranquilidade entrou na Oração das Completas, recitada antes do descanso nocturno, a partir do século V. De notar que, no final do Evangelho de Lucas, formado uma bela inclusão literária e teológica, aí está JOSÉ DE ARIMATEIA, também apresentado como «homem bom e justo» (Lucas 23,50), que esperava o Reino de Deus (Lucas 23,51), e que recebeu o corpo morto de Jesus (Lucas 23,53).

5. E, na circunstância, também uma velhinha chegou carregada de esperança. Chamava-se ANA, que significa «GRAÇA»; é dita «Profetiza», isto é, que anda sintonizada em alta fidelidade (hi-fi) com a Palavra de Deus; era filha de «Fanuel», que significa «Rosto de Deus»; era da tribo de «Aser», que significa «Felicidade». Tanta intimidade com Deus! Também esta velhinha serena e feliz – com 84 anos, número perfeito de números perfeitos (7 x 12) – viu aquele MENINO. E diz o Evangelho que se pôs a falar dele a todos os que esperavam a libertação de Jerusalém!

6. Esta é a Festa da Alegria e da Esperança acumulada e realizada. É a Festa da Luz, a que anda associada a bênção e a procissão das velas, documentada na antiga Gália, desde o século X. SIMEÃO e ANA viram a Luz e exultaram de Alegria. HOJE somos nós que nos chamamos SIMEÃO e ANA. Somos nós que recebemos esta Luz nos braços, e que ficamos a fazer parte da família da Felicidade e a viver pertinho de Deus, Rosto a Rosto com Deus, Escutadores atentos do bater do coração de Deus. Felizes sois vós, os pobres! (Lucas 6,20). Felizes os olhos que vêem o que vós vedes e os ouvidos que ouvem o que vós ouvis! (Lucas 10,23).

7. Fevereiro é um mês de Alegria, de Apresentação e Encontro, de Consagração e Contemplação. Num mundo triste e cansado como o nosso, Maria, José e o Menino, Simeão e Ana são ícones de Felicidade, que nos vêm dizer que se cresce, não apenas em idade, mas em idade, sabedoria e Graça!

D. António Couto
(in Mesa da Palavra, 02 Fevereiro 2011)