Mensagem de Natal dos Bispos de Beja
Irmãos e não escravos
Aproxima-se mais um Natal e o início dum Novo Ano. Trocam-se mensagens e presentes com votos de festas felizes, muitas vezes só entre familiares e amigos.
Festas felizes! Que felicidade, que festas, num mundo tão desigual?!
Todos nascemos e, por isso, todos temos o nosso dia de natal. Uns nasceram em berços de oiro e outros em estábulos, como o Menino de que celebramos o nascimento a 25 de Dezembro, apesar de ser o Filho de Deus que nos veio salvar. Com Ele, para quem n’Ele acredita e conhece a Sua história, começa a grande reviravolta dos critérios de felicidade da maioria das pessoas. Afinal não é pela riqueza material que podemos salvar-nos e salvar os outros: é pelo despojamento dos bens materiais e de nós mesmos que adquirimos a capacidade de nos irmanarmos, de sermos felizes e de fazermos a festa que dá alegria profunda e duradoira.
Na mensagem para o Dia Mundial da Paz, a 1 de janeiro de 2015, o Papa Francisco refere estes pensamentos e afirma que o deus dinheiro cria a inversão de valores da verdadeira humanidade e é causa de muitas formas da moderna escravatura que cava profundas desigualdades entre os seres humanos e torna inviáveis a paz e a felicidade. Cada frase desta mensagem pode dar origem a um profundo exame de consciência pessoal e coletivo e contribuir para humanizar a nossa sociedade e tornar-nos mais fraternos, mais irmãos, mais felizes. Assim podemos, com verdade, exprimir os votos de feliz Natal e Ano Novo, porque mais irmãos e mais fraternos.
Vivendo nós num mundo de grande mobilidade, motivada quase sempre por razões económicas, as pessoas, as sociedades e os estados precisam de dar grande atenção ao acolhimento destes migrantes, para que não sejam escravizados por motivos económicos. É no mundo das migrações que encontramos hoje muitas formas de escravatura, explorando a necessidade e a fragilidade dessas pessoas com trabalho escravo, fazendo depender a autorização de estadia de um contrato de trabalho, com tráfico de órgãos, com exploração sexual, expondo-as a intermediários sem escrúpulos. Quem assim procede com as crianças, os estrangeiros e os pobres, como pode celebrar o Natal de Jesus? Ele, sendo rico, Filho de Deus, nasceu pobre, indefeso, confiando em nós, e assim, quem acolhe alguém frágil, pelas mais diversas causas, é a Cristo mesmo que recebe.
Depois de tantos anos a celebrar o Natal, será que já tiramos algumas ilações deste grande mistério de Deus connosco? Estou convencido que, entre avanços e recuos, a humanização vai prosseguindo. Embora no hemisfério norte a construção de uma sociedade sem Deus se vá afirmando, muitas expressões das suas leis e costumes têm raizes nos códigos religiosos, sobretudo na Bíblia, como os ideais da revolução francesa e a declaração dos direitos humanos, promulgada a 10.12.1948 e entretanto ratificada pela maioria dos países democráticos, embora nem sempre posta em prática em todos os seus artigos.
Continuemos a celebrar o Natal, a recordar o nascimento de Jesus e tudo o que aconteceu à sua volta, também aquilo que Ele disse e viveu. Água mole em pedra dura tanto dá até que fura, diz o provérbio popular. Os lindos cantares de Natal, o Cante ao Menino do Cante Alentejano, agora declarado património imaterial da humanidade, o costume da ceia em família, juntando os familiares de várias gerações no torrão natal, os presépios, as orações e liturgias, os cabazes de Natal e a atenção aos pobres, os gestos de solidariedade, os enfeites e as luzes, tudo vai contribuindo para que vá surgindo uma nova sociedade, mais igual, mais fraterna, mais justa e feliz.
Olhemos também de perto para aqueles e aquelas que dedicam toda a sua vida a Deus, à Igreja e aos mais necessitados, a quem neste Ano da Vida Consagradaqueremos agradecer e por eles rezar, para que nunca falte na nossa diocese este precioso testemunho de vida cristã.
Com o estribilho do Cante de Pias ao Menino, ponde em nós os vossos olhos, misericórdia, amor,desejamos a todos os diocesanos alegres festas de Natal e Ano Novo abençoado.
† António Vitalino, Bispo de Beja
† João Marcos, Bispo Coadjutor de Beja
Sem comentários:
Enviar um comentário