Páscoa é uma experiência de reconstrução do homem. Vivida pelo Povo eleito como libertação da escravidão e passagem à vida, a Páscoa será, ano após ano, recordada como alicerce firme da Aliança de Deus com o seu Povo. Quando os Israelitas chegaram às portas da Terra de Canaã, Moisés enviou os chefes de tribo para explorarem a terra e perceberem se podiam ou não entrar. Ao regressarem, uns relatavam a opulência do país e denunciavam a impossibilidade de entrar nele, outros sentiam as condições adversas como um verdadeiro desafio. Apenas Caleb e Josué se mostraram optimistas por uma razão de fé: O Senhor está connosco, não os temais. O que distinguiu Caleb e Josué não foi tanto a percepção do país, das suas gentes e das suas condições, mas sim a sua confiança em Deus. A grande dificuldade de Israel, naquele momento, era feita da conjugação do medo que nascia da observação da realidade com a falta de confiança em Deus. Os que confiaram entraram, os outros não.
Naquele momento, às portas de Canaã, Israel teve de mudar de paradigma na sua vida: os seus conhecimentos de Canaã não eram inválidos, mas a confiança em Deus tinha que ser maior (Num 13, 1-3; 17-33; 14, 1-34; Lc 4, 16-22).
A memória do processo de libertação, com todos os seus momentos e experiências, dá ao povo de Deus a segurança da intervenção criadora e salvadora de Deus. Porque é memória regressa com o coração às situações e experiências humanas de limite; mas porque é memória de libertação, volta-se para o futuro, constrói e fundamenta a esperança.
Foi esta Páscoa que Jesus celebrou e foi a esta Páscoa que Jesus deu novo sentido e novo horizonte. Jesus celebra a Páscoa com os discípulos mas agora os territórios de escravidão e de morte têm outros nomes: chamam-se pecado e incapacidade de amar, chamam-se infidelidade e idolatria. Por isso, ao pão e ao vinho, Jesus dá um novo significado e um novo horizonte. Doravante serão a expressão e o testemunho da sua entrega, do seu amor. Alimentar-se de Jesus é isso mesmo, alimentar-se do seu amor. E daí resulta uma nova Páscoa: ao Cruz, ao contrário de ser o fim da vida de Jesus, é a sua plenitude.
Tomai e comei... Tomai e bebei..., continua a Igreja a dizer por mandato de Jesus. Se Jesus o disse de si mesmo e se a Igreja é o Corpo de Cristo, significa que dar-se por amor em alimento é a fonte da nossa missão.
A Igreja renova-se, pois, todos os anos na celebração da Páscoa.Nasceu como Comunidade / Corpo de Cristo ressuscitado (a Igreja são os que dizem “sim” a Cristo e projectam a vida como seguimento e participação da vida de Cristo) e renova-se fazendo memorial da sua origem, do seu alicerce e da sua missão e finalidade.
Já na Semana Santa, mas ainda fora do Tríduo pascal, celebra-se em todas as Dioceses a Missa Crismal que reúne o Povo de Deus com os seus Pastores mas onde o que é mais expressivo é a reunião de comunhão (eucarística) dos Presbíteros de uma Diocese com o seu Bispo. Parecendo que é apenas uma acção interna da Igreja, a Missa Crismal é, no entanto, a expressão de uma Igreja que não existe para si mesma, mas sim para ser sinal e sacramento de Jesus Cristo.
Reunidos em comunhão com o seu Bispo, e todos no horizonte do Povo de Deus, os Presbíteros renovam nesta Celebração as suas Promessas Sacerdotais. E é também nesta Celebração que o Bispo diocesano consagra o Óleo do Crisma e benze os Óleos dos Catecúmenos e dos Enfermos.
Reaviva o dom de Deus que está em ti pela imposição das minhas mãos é a palavra de S. Paulo a Timóteo na sua primeira carta. Renovar as promessas, hoje, é precisamente, reavivar o dom do sacerdócio ministerial. O dom não se reaviva por méritos ou qualidades pessoais, mas por encontro com o Mestre na oração e na vida de todos os dias.
«O Senhor Jesus Cristo, a Quem o Pai ungiu pelo poder do Espírito Santo e seu poder, te guarde para santificares o povo cristão e ofereceres a Deus o sacrifício» rezava o Bispo que nos ordenou quando nos ungia as mãos. Esse é o dom que é preciso renovar.
A renovação das promessas sacerdotais, num contexto de oração como é a Eucaristia, é, por isso mesmo, extremamente expressiva: afirmando a renúncia a si mesmos, os Presbíteros reafirmam a vontade de se configurarem com Jesus Cristo que veio para servir e não para ser servido; reafirmam, além disso, o sentido das suas vidas como fiéis dispensadores dos mistérios de Deus na celebração da Eucaristia e nas outras acções sem ambicionarem bens materiais mas unicamente movidos pelo amor a Deus traduzido no serviço da fé e da vida aos irmãos.
P. Emanuel Silva
Portalegre-Castelo Branco