quinta-feira, 20 de setembro de 2012

Sempre em missão, ao perto ou ao longe



O Decreto sobre “A atividade missionária da Igreja” é um dos documentos do Vaticano II mais expressivos na sua dimensão pastoral. A sua votação foi a mais participada, porque a todos os bispos conciliares, por certo, o tema lhes era sensível. A Igreja é missionária por natureza, e incarna, até ao fim dos tempos, o mandato de Jesus: “Ide por todo o mundo, anunciai a Boa Nova, fazei discípulos…” Recorda o Decreto que a missão é desígnio eterno no Pai, realizada pelo Filho, animada pelo Espírito e entregue à Igreja como responsabilidade que a acompanhará sempre.

As primeiras comunidades cristãs não organizavam a expansão missionária, porque tinham uma viva consciência do seu dever. Todos os seus membros em Cristo se sentiam em missão evangelizadora. A sua vida e testemunho faziam que cada dia crescesse o número dos que acreditavam e pediam o Batismo (Act 2,42-47). A preocupação dos Apóstolos e seus imediatos sucessores foi fundar, entre os pagãos, pequenas comunidades de crentes, irmãos na fé, conscientes do seu dever missionário.


Depois, durante séculos, a fé foi-se transmitindo na família, de modo pacífico, mas perdeu-se o ardor de fazer nascer novas comunidades cristãs. Todos nasciam já crentes… Um dia a Igreja teve de acordar para a responsabilidade que impendia sobre o Papa e os bispos, de suscitar e dar vida ao espírito missionário. E foi nascendo e crescendo este espírito, sobretudo nas ordens e congregações religiosas. 

Viram-se, então, grupos de generosos missionários a partir da Europa para zonas onde não havia ainda chegado a pregação do Evangelho. Muitos foram mártires em terra ou no mar, mas foram nascendo, graças à sua ação e doação, outras comunidades crentes, na América Latina, na África, no Oriente. Jamais se pôde parar esta aventura de anunciar Jesus Cristo, dom do Pai para a salvação de todos. O Decreto conciliar dá conta deste esforço da Igreja, estimulado pelo Papa e pelos bispos, que fez nascer, na Europa, muitas congregações missionárias de homens, a que se foram também juntando outras de mulheres. Até no seio do clero diocesano nasceram vocações e sociedades missionárias. Por todo o lado, o Povo de Deus foi sendo animado, de modo a apoiar este esforço, por todos os meios possíveis, espirituais e materiais. 

O documento conciliar, partindo do dever da Igreja, centra-se em alguns pontos fundamentais: o testemunho de vida e o espírito de diálogo dos missionários, a sua presença animada pelo amor, a pregação adequada, o catecumenato e a iniciação à vida cristã. Nas missões, urgia sempre a formação de novas comunidades, a promoção do clero local e da vida consagrada, a preparação de catequistas do meio. Todo o caminho se fazia em ordem à missão e à expansão da fé em Jesus Cristo. 

As dioceses acordaram para o dever de promover o espírito missionário entre todos os membros das comunidades e dos grupos, dado que este espírito é característica de uma fé esclarecida e autêntica. Os cristãos são missionários pelo Batismo. Os pastores da Igreja devem dar um exemplo convincente deste espírito e fomentá-lo por todos os meios ao seu alcance. Daí a promoção de vocações missionárias de jovens, mediante a formação, a cooperação para apoio às atividades concretas das missões, a abertura das paróquias ao testemunho e à pregação dos missionários, as formas de geminação que alimentam este espírito apostólico e fraterno, entre os cristãos, fomentando o voluntariado missionário, mormente entre os jovens, os adultos e os doentes. 


João Paulo II deu, com a vida, grande testemunho da sua preocupação missionária. Correu o mundo e publicou, em 1990, a Exortação Apostólica “Missão do Redentor”, avivando a doutrina do decreto conciliar. Também os bispos portugueses deram, há pouco, publicamente conta do seu dever missionário, bem como das suas dioceses, esforçando-se mais por concretizar a sua responsabilidade (cf. Carta Pastoral “Como Eu fiz fazei vós - Para um rosto missionário da Igreja em Portugal”, de junho de 2010). 

O Concílio trata, por fim, da organização da atividade missionária e reforça, a terminar, a cooperação que se pede aos bispos, presbíteros, consagrados e leigos. Ao perto e ao longe, resta ainda muito para fazer, seja na ação missionária em terras tradicionais de missão, seja nas comunidades dos países de cristandade, onde urge, cada vez mais, uma nova evangelização, em ordem a uma fé viva, esclarecida e apostólica.


António Marcelino, Bispo emérito de Aveiro (in “Notícias de Beja”, 2/09/2012)

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