terça-feira, 20 de dezembro de 2016

MENSAGEM DE NATAL-2016



Uma grande alegria para todos! 
1 - Irmãos e amigos:
Nos últimos dois séculos tornou-se moda, em alguns ambientes culturais, dizer que o Cristianismo é uma religião triste, que Jesus Cristo é o Deus do sofrimento, da resignação, da agonia e da cruz. E os eruditos citavam que, nos evangelhos, vemos Jesus chorar várias vezes, mas nunca rir, e alinhavam algumas sentenças do Senhor, descontextualizadas, como estas: felizes os que choram, ai de vós que rides agora porque haveis de chorar… Estarão os cristãos condenados a viver na tristeza para serem fiéis ao seu Mestre crucificado? E será uma fatalidade que o povo português, o povo do fado e da saudade, seja um povo triste? 
Como o Papa Francisco tem repetido, onde entra a luz do Evangelho, onde entra Jesus Cristo, entra a alegria. Na vida dos cristãos, tal como na dos outros homens, há certamente lugar para a tristeza, mas também, e sobretudo, para a alegria, para aquela alegria profunda à qual temos acesso, simbolicamente, pela porta minúscula e humilde da basílica e da gruta de Belém. Escutai a mensagem anunciada pelo anjo aos pastores no primeiro Natal, mensagem que hoje, neste contexto concreto em que vivemos, quero fazer ressoar para todos vós, sobretudo para aquelas e aqueles que viveis mergulhados na tristeza:



Não temais, porque vos anuncio uma grande alegria para todo o povo: nasceu-vos hoje, na cidade de David, um Salvador, que é Cristo Senhor! Isto vos servirá de sinal: encontrareis um Menino recém-nascido envolto em panos e deitado numa manjedoura.
Esta é uma mensagem de alegria, de grande alegria para todo o povo, alegria provocada pelo nascimento de Deus no meio de nós. É uma mensagem necessária e atual como há dois mil anos, pois Aquele Menino nascido em Belém da Virgem Santa Maria cresceu, realizou a sua missão, morreu numa cruz por nós mas foi ressuscitado pelo Pai e vive no meio de nós, através dos tempos, continuando a formar-Se, a nascer, a crescer e a atuar, pelo Seu Espírito, no coração e na vida dos que n’Ele acreditam. Esta acessibilidade de Cristo que o Pai nos oferece é a expressão máxima do seu amor para connosco e a nascente da verdadeira alegria! Pelo Seu Espírito e com a tua colaboração, Deus quer realizar em ti, espiritualmente, a maravilha que realizou com Maria: o nascimento de Jesus que vem libertar-te da tristeza e oferecer-te a indescritível alegria de quem pode amar porque se reconhece amado. Ele conhece os teus sofrimentos e a necessidade que tens d’Ele para seres feliz, e vem ao teu encontro pedindo-te humildemente para Lhe abrires a porta do teu coração. Ele quer viver contigo porque deseja muito que tu vivas com Ele. Deus fez-Se homem para nos dar o Seu Espírito, para nos fazer participantes da sua natureza divina pela qual nos tornamos seus filhos adotivos e herdeiros. Para nós pecadores que fazíamos inferno para os outros e para nós próprios, Deus abriu as portas do Céu.
2 - Tendo escutado o anúncio do anjo, os pastores foram a Belém e encontraram Jesus recém-nascido, envolto em panos e deitado na manjedoura. Como escutaram, assim viram. E começaram a contar o que tinham ouvido e visto. Escutaram, caminharam, encontraram, anunciaram. Queres que a grande alegria do mistério do Natal inunde a tua vida? Como os pastores escuta, caminha, vê, fala! Deixa que o Senhor Jesus cure a tua surdez e a tua paralisia, a tua cegueira e a tua mudez espirituais! Escuta a boa notícia que o Senhor te faz chegar por este texto, caminha como discípulo, entra na Igreja onde a Sagrada Família te receberá e verás Jesus presente nos irmãos e nos acontecimentos da tua vida. Hoje, Belém, casa do pão, é a Igreja. É no seio da Igreja que se formam e nascem os filhos de Deus. A Igreja é, por isso, o lugar da grande alegria para todo o povoque acredita em Jesus: pobres e ricos, doutores e analfabetos, doentes e sãos. Poderás então, como os pastores de Belém, dar testemunho do que ouviste, do que viste, da vida nova que recebeste e cresce em ti. E assim poderás oferecer aos teus parentes, amigos e conhecidos, a melhor prenda de Natal.
3 - Porque teimas em defender como um tesouro a ferrugem da tristeza e da solidão que te devora a alma, e te sepultas vivo no lamaçal das tuas amarguras e angústias? Não tenhas medo do Deus Menino que bate à porta do teu coração, cheio de amor. Abre-Lhe, deixa que a alegria da salvação inunde o teu coração ressequido e o transforme num jardim! Não temais, vós que sofreis momentos difíceis ensombrados pela doença, pela morte e pela solidão, vós que vos sentis perdidos na vida, esmagados com problemas familiares, sem amor e carinho de ninguém, vós cuja vida parece reduzir-se a uma coleção de desilusões e de fracassos, que sofreis as consequências do egoísmo e carregais com o peso dos crimes e da corrupção desta sociedade desumanizada. Não temais porque o Senhor vos ama e vem para transformar as vossas vidas. Abri-Lhe, dai-Lhe espaço em vossos corações, celebrai e vivei o Natal com alegria!
4 - Celebrar o Natal é lutar contra a tristeza e o desânimo, contra o fatalismo e contra a degradação dentro de cada um de nós e à nossa volta, é celebrar a esperança e a alegria, é acolher o Único que tem poder para nos libertar do pessimismo e iluminar a nossa vida com a sua sabedoria. Vivamos o Natal, aprendamos com os anjos a dar glória a Deus para que floresça na terra uma paz verdadeira.
Queridos irmãos e irmãs: por obra do Espírito Santo, cumpra-se em vós aquilo que o Senhor vos promete por meio desta mensagem! Ele vos abençoe e vos dê a sua paz e a sua alegria e, por meio de vós, a muitos outros!



Rezai por mim.

+ J. Marcos,

Bispo da Diocese de Beja

segunda-feira, 12 de dezembro de 2016

IV DOMINGO DO ADVENTO

Um homem tramado

1 – Enquadrando o nascimento de Jesus na encenação do que era a vida quotidiana do povo, de acordo com a estética barroca e a espiritualidade inaciana, o presépio tradicional português afirma claramente que a vida das pessoas e da sociedade tem um centro e uma fonte que as ilumina e perspetiva: Jesus Cristo Salvador, o Emanuel, o Deus connosco. Mas essa mesma encenação tornou o presépio visualmente muito ruidoso: além dos anjos, dos magos com seus camelos e dos pastores com suas ovelhas, ali vemos representadas as diversas profissões, mulheres lavando a roupa no ribeiro e os patinhos a nadar junto da pequena ponte; mais além, os homens na taberna e o moleiro com o burro carregado de sacos de grão a caminho do moinho; do outro lado, num recanto, a mulher que vai à fonte e a matança do porco, enquanto desce ordeiramente pela rua a procissão com banda de música e foguetes. Os olhos passeiam-se em todas as direções, e naquela exuberante catadupa de imagens tudo respira e transpira alegria e festa. Contrastando com toda esta animação, a figura de Jesus na manjedoura está envolvida de silêncio pela presença muda da vaca e do burro e pela adoração e interioridade de Maria e de José.
 
Quem é José? Como o seu homónimo filho de Jacob, é o homem dos sonhos. Deus revela-lhe a Sua palavra durante o sono. O Evangelho deste quarto domingo do Advento coloca diante de nós o anúncio a José, ou seja, a evangelização deste homem discreto, justo e silencioso, pela qual lhe é revelado o desígnio de Deus que ele abraça com prontidão. Quando despertou do sono, José fez como o Anjo do Senhor lhe ordenara e recebeu Maria sua esposa.

2 - Acolhendo a mensagem do anjo, José ficou tramado no desígnio de Deus. Escutou dormindo mas respondeu acordado, aceitando a eleição divina e obedecendo à Sua vontade. Não se revoltou, não discutiu, não protestou, não reivindicou o direito a viver a sua vida como tinha planeado, não negociou condições. José escuta e obedece. Recebe como ordem divina aquelas palavras do Anjo que não eram uma ordem mas um convite. Essas palavras do anúncio, ao iluminá-lo acerca da gravidez de Maria revelam-lhe também que Deus o escolhera para ser o pai adotivo do Seu Filho a Quem ele, José, poria o nome de Jesus. Era necessário que o Filho de Deus tivesse uma família onde pudesse crescer e tornar-se adulto, e José foi escolhido por Deus para ser o chefe dessa família única, a primeira família do Novo Testamento, imagem e modelo de todas as famílias cristãs e da própria Igreja.

Os evangelistas não registaram dele uma única palavra. O silêncio orante deste homem contemplativo, servidor diligente e humilde da Encarnação do Verbo de Deus juntamente com Maria, foi a moldura justa e necessária para que Jesus, a Palavra Encarnada, desabrochasse humanamente. Tal como Maria sua esposa, José aceitou livre e amorosamente ser tramado, quer dizer, ser integrado neste tecido que é o desígnio de Deus a realizar-se. Mas como facilmente se depreende de tudo o que nos é referido acerca dele, José não se tornou uma pessoa tramada, difícil, complicada, ressentida e azeda. Não viu Deus como seu adversário, não duvidou do Seu amor e pôs-se inteiramente ao Seu serviço comoservo fiel e prudente à frente da Sua casa. E o Senhor confiou a este homem justo os maiores tesouros: o Filho de Deus feito homem e a Virgem sua mãe. A nós, pastores da Igreja, também.

3– Tudo isto aconteceu para se cumprir o que o Senhor anunciara por meio do profeta que diz: A Virgem conceberá e dará à luz um filho, chamado Emanuel, que quer dizer: Deus connosco.


A Virgem grávida! Eis o sinal de esperança que, do Génesis ao Apocalipse percorre a Sagrada Escritura, e a História da Humanidade. Quando tudo parece desaguar na morte, a miraculosa fecundidade da mulher, a Virgem grávida, é o sinal de que há futuro porque Deus está connosco. Há tanta gente que pede milagres e sinais e tenta a Deus, e não consegue decifrar os sinais que Deus generosamente coloca diante dos seus olhos. A Virgem grávida, hoje, é a Igreja, posta no mundo como sinal, como Sacramento de Salvação. Este é o grande sinal de esperança oferecido por Deus aos homens. Mas quem repara nele? Muitos rejeitam este sinal incómodo porque convida a mudar de vida. Defendem-se dele e hostilizam-no, mas não conseguem destruí-lo porque Deus o defende. Têm-no diante dos olhos e não o sabem interpretar. De facto, o sinal precisa da palavra que o explicite. José precisou de ser evangelizado, de receber o anúncio do anjo para compreender o sinal e aceitar, sem medo, o desígnio de Deus a seu respeito. Assim também nós.

4 – Nas representações mais antigas do nascimento de Jesus, José é representado, não na gruta, junto de Jesus e de Maria, mas numa extremidade da cena, sendo tentado pelo demónio na figura de um pastor que lhe diz: estás tramado! Tens de criar um filho que não é teu! Nada disto faz sentido: onde é que já se viu uma virgem dar à luz? Dá um pontapé nesta história e vive a tua vida como qualquer outro homem!

José vence a tentação arrancando do fundo do seu silêncio esta certeza: É verdade! Sou um homem livremente e por amor tramado para que Deus tenha lugar no mundo e assim possam despertar do sono e destramar-se do mal aqueles que se julgam livres e felizes no seu egoísmo, tramando os outros.Possamos dizer isto, com verdade, nós também.



Meus queridos irmãos e amigos: a todos vós, tramados pelo Espírito Santo com Jesus, Maria e José na vontade amorosa do Pai, desejo um santo Natal.                  
 + J. Marcos,
Bispo de Beja


sábado, 3 de dezembro de 2016

 S. Francisco Xavier – Padroeiro das Missões
Francisco Xavier nasce perto de Pamplona, Espanha, a 7 de Abril de 1506, quinto filho de D. João de Jassu, Senhor de Xavier e Ydocin, e de Dona Maria de Azpilcueta e Xavier. Aos 19 anos está em Paris, instalado no Colégio de Santa Bárbara, a estudar Humanidades. Forma-se depois em Filosofia e Teologia pela Sorbonne. Aí conhece Inácio de Loyola que viria a ser fundador da Companhia de Jesus. Torna-se seu amigo e seguidor.




A 15 de Agosto de 1534, na Capela de Montmartre, faz votos de pobreza e castidade perpétua. Recebe as Ordens Sacras em Veneza a 24 de Junho de 1537, seguindo depois para Roma onde se põe à disposição do Papa para o serviço da Igreja. A 15 de Março de 1540 parte de Roma com destino a Lisboa, onde chega três meses depois.

Enviado pelo Papa Paulo III, era a resposta de Roma aos apelos veementes do Rei de Portugal, D. João III, preocupado com a evangelização da Índia e a dilatação da Fé no Oriente.

De Portugal para o Oriente
Chegado a Lisboa, o Pe. Francisco Xavier refugia-se no Hospital de Todos-os-Santos onde de imediato se dedica aos enfermos e ao ensino da doutrina cristã. Ganha em pouco tempo a percepção do universalismo dos portugueses e de Lisboa larga, a 7 de Abril de 1541, na armada das índias, para ser Apóstolo e Santo. Antes da partida, o Rei D. João III entrega-lhe o Breve Papal nomeando-o Núncio Apostólico nas Partes da índia, com amplos poderes para estabelecer e manter a Fé em todo o Oriente.


Depois de uma breve passagem em Moçambique, chega a Goa a 6 de Maio de 1542. Logo se apresta a ir oferecer os seus serviços a D. João de Albuquerque que pastoreia a Diocese de Goa, na altura a mais dilatada da Cristandade. Rapidamente se apercebe de uma vida religiosa local muito precária, e carenciada de assistência. Os pouco mais de dez anos que se seguem até à sua morte, vai vivê-los de forma febril, andando por terra e por mar, sem nunca parar, num frenesim constante a espalhar a palavra Divina, a levar a Boa Nova.

Logo em Outubro de 1542 parte para o Sul da índia a evangelizar os pescadores da Costa da Pescaria. Visita Comorim, Manapar e Tuticorim. Em Outubro de 1543 regressa a Goa. Fundada canonicamente a Companhia de Jesus, o Padre Francisco Xavier é nomeado Superior de toda a Missão da índia Oriental, desde o Cabo da Boa Esperança até à China. Volta à Costa da Pescaria. Visita depois Cochim, Malaca, as Molucas, Macassare, Ceilão. Ensina, baptiza, e concilia príncipes desavindos.

Morte em Sanchoão
A 15 de Agosto de 1549, via Cochim e Malaca e navegando pelos mares da China, chega a Kagochima, na costa meridional do Japão. De regresso a Cochim envia cartas ao Rei D. João III. Solicita-lhe reforços missionários. Tentando a missionação na China, para lá se dirige a bordo da nau Santa Cruz. Em Singapura volta a escrever a D. João III. Em Setembro de 1552 desembarca na Ilha de Sanchoão, a dez léguas da Ilha de Macau, na China.

Aí adoece gravemente. Sofrendo vertigens e convulsões, minado por febres devoradoras, cheio de privações, morre só e pobre na noite de 2 para 3 de Dezembro de 1552. Havia percorrido milhares de quilómetros, cruzado várias vezes os mares do Índico e do Pacífico, visitado mais de cinco dezenas de reinos, fundado Igrejas, reorganizado as missões.

Exemplo de humildade e de solidariedade cristã, de amor ao próximo e de evangélica pobreza, era venerado por milhões de pessoas de todas as condições sociais, de todas as idades, de todas as etnias. A fama de Santo, o "Santo de Goa", tinha chegado a toda a parte, as suas virtudes eram exaltadas.

Em 17 de Fevereiro de 1553 o seu corpo é removido e levado para Malaca e daqui para Goa, onde chega a 16 de Março de 1554. A recebê-lo, numa impressionante manifestação de Fé, estão o Vice-Rei, o Clero, a Nobreza e o imenso Povo.

A subida aos altares
A devoção de que já gozava em vida vai crescer extraordinariamente depois da morte. Os seus milagres tornam-se conhecidos. A 25 de Outubro de 1605 Francisco Xavier é beatificado por Paulo V e Gregório XV canoniza-o a 12 de Março de 1622. A 24 de Fevereiro de 1748 Bento XIV proclama-o Padroeiro do Oriente.

Em 1904 Pio X coloca sob a sua protecção a Sagrada Congregação da Propagação da Fé. Em 1927, Pio XI constitui-o, com Santa Teresa do Menino Jesus, protector de todas as obras missionárias.
O seu corpo repousa numa riquíssima urna de prata, na Basílica do Bom Jesus, na Velha Goa.

Para lá se dirigem todos os anos milhares de peregrinos, crentes e mesmo não crentes, venerando o "Homem Bom", o Apóstolo incansável. A Igreja festeja-o todos os anos no dia 3 de Dezembro.


In “Paróquia de S. Francisco Xavier – Lisboa”